Artigo puclicado na Tribuna do Norte - 14.04.17
Vítimas do medo e da violência
Infelizmente, sou de um tempo em que caminhar pelas ruas de Natal era um momento de encontro, de conversas, de brincadeiras, onde reinava a absoluta tranquilidade. Um tempo em que chamar Natal de provinciana era um elogio, diante da escalada de violência e medo que invadiu nossas ruas e casas.
Vivemos hoje um cenário de guerra urbana, onde o sair e o chegar em casa passou a ser uma aventura arriscada. A sociedade se aquartelou em suas residências, diante da incompetência estatal em garantir a segurança para seus cidadãos, e hoje, aqueles que podem, transformaram seus alpendres em bunkers escuros e sem vida. Já não se vê mais cadeiras nas calçadas, redes nas varandas e conversas no portão.
O sucateamento da estrutura de segurança do estado, o baixo efetivo das polícias (civil e militar), a ausência de políticas públicas de enfrentamento ao consumo de drogas, a quase inexistência de projetos de ressocialização de apenados, entre outros, são fatores que impedem o combate eficiente à crescente criminalidade, mas certamente não são a raiz do problema da violência.
Combater o crime não é o mesmo que buscar a pacificação social! É preciso, sim, de forma urgente e eficiente, que o estado retome o controle das ruas e que as pessoas voltem a caminhar tranquilas, a circular em seus carros sem medo de dobrar a esquina e se deparar com o criminoso armado que irá toma-lo de assalto, mas isso é apenas a “ponta do iceberg”.
O estado brasileiro e seus dirigentes elegeram o bandido como o grande inimigo, quando eles é que verdadeiramente o são, no momento em que deixam de investir na educação básica e fundamental; em que fecham os olhos para o grave problema social que é o consumo de drogas, a atingir cada vez mais os jovens e crianças; em que permitem o amontoar de seres humanos em pocilgas inabitáveis chamadas de cadeias, estimulando a prática da violência e não a ressocialização; no exato instante em que o investimento em políticas de valorização da família dá lugar ao criminoso superfaturamento de obras e contratos públicos.
E a sociedade tem que acordar para o fato de que cada um de nós não é apenas objeto nas mãos de gestores ineficientes, mas sim, sujeito dessa história. Para isso, precisa compreender que não basta celebrar prisões, mas deve também se inserir em ações efetivas de controle da violência.
Fechar os olhos e achar que o problema “não é comigo” já deixou de ser uma opção válida. Não precisamos ser especialistas para saber que países onde a população tem acesso à educação, à saúde, ao bem-?estar, à justiça, onde direitos sociais e individuais são respeitados, os índices de criminalidade praticamente não existem. O que podemos fazer então?
Primeiro, ter consciência de que a atual geração não verá o resultado de medidas que agora venham a ser efetivamente implementadas, pois os seus frutos somente aparecem depois de décadas.
Em seguida, saber que o seu voto não tem preço, tem consequências, conforme o alerta que há alguns anos a Ordem dos Advogados do Brasil vem fazendo junto à população, tentando mostrar a importância e a reponsabilidade que cada eleitor tem ao escolher os seus representantes, os seus gestores, pois são eles quem tem o dever de desenvolver ações cujo objetivo seja o de ofertar condições de vida dignas para todos.
O leitor pode achar utópico falar aqui em querer que o Brasil, que o Rio Grande do Norte, se transforme em uma Suécia, em uma Noruega, mas é olhando, e aplicando entre nós, modelos que conseguiram corrigir os problemas na raiz da violência urbana, que podemos realizar algo.
Corredores de hospitais cheios de moribundos a espera de atendimento, sem acesso a medicamentos, escolas sem aula, alunos sem lanche e sem livros, são formas de violência somente sentidas por aqueles que vivem esses problemas. No entanto, somos todos responsáveis!
É preciso manter viva a capacidade de se indignar, de não aceitar o inaceitável, de lutar contra toda forma de violência, unindo forças para que um dia possamos viver em uma sociedade mais justa e em paz, pois hoje, somos todos vítimas do medo e da violência.
Paulo Coutinho Filho – Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no RN
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