É flagrantemente inconstitucional a redução da maioridade penal para 16 anos e a redução pura e simples da maioridade não irá proporcionar a reinserção social de menores infratores e a diminuição dos índices de criminalidade no país, benefícios tão reclamados pela sociedade. Essa foi a posição defendida pelo presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado, ao participar, nesta segunda-feira (03), da primeira de três audiências públicas que serão realizadas sobre o tema pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal.
Ao questionar a eficácia das três Propostas de Emenda à Constituição (PECs) que tratam da matéria – de números 33/12, 74/11 e 83/11 -, o presidente da OAB afirmou que, muito melhor do que reduzir a maioridade, seria o Estado garantir o cumprimento de efetivas politicas públicas destinadas à proteção da infância e adolescência, com investimento permanente de recursos financeiros focados na educação, lazer e desporto, atividades culturais e na inserção dos adolescentes no meio social e no mercado de trabalho.
“Com a notória redução de investimentos nessas políticas, o Estado não tem conseguido convencer os adolescentes de que, integrados à sociedade, eles podem crescer e progredir. Sem receberem o tratamento adequado, esses seres humanos acabam virando peças vulneráveis para o cometimento de infrações e sentem-se acolhidos nas instituições criminosas”, afirmou Marcus Vinicius. “Toda vez que isso acontece, o debate na sociedade normalmente se foca na redução da maioridade penal. Os estudos, no entanto, são conclusivos no sentido que essa redução não irá trazer à sociedade proteção maior do que atualmente”, acrescentou.
A conclusão de que a maioridade penal não servirá para o fim de reduzir a criminalidade, segundo explicou Marcus Vinicius, decorre também da constatação de que o sistema carcerário brasileiro não vem cumprindo com a sua função de ressocializar e recuperar aqueles que cometem delitos. O que vem ocorrendo, segundo o presidente da OAB, é o descumprimento sistemático do ECA, que, quando prevê a internação, determina que esta seja acompanhada de educação profissionalizante e de estímulos para que os adolescentes não cometam novos crimes.
“Um Estado que não tem políticas educacionais, de lazer, de saúde, de ingresso desses adolescentes no mercado de trabalho e que não tem um sistema carcerário voltado para a reeducação detém legitimidade para tratar adolescentes de 16 anos como adultos?”, questionou o presidente nacional da OAB.
Constitucionalidade
Ao analisar a questão quanto ao aspecto da constitucionalidade, o presidente da OAB destacou que o artigo 228 da Carta Magna prevê que a maioridade penal se dá aos 18 anos, cláusula pétrea que não pode ser alterada. Ele chamou a atenção ainda para o artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Carta, que prevê que não pode haver proposta de emenda tendente a reduzir ou limitar direito individual.
“A maioridade penal aos 18 anos é direito individual e, logo, não pode ser removido. Eventual mudança mediante emenda não supera a análise da constitucionalidade”, afirmou Marcus Vinicius, lembrando que, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionjalidade número 939, o Supremo Tribunal Federal decidiu que os direitos individuais não são apenas os previstos no artigo 5º da Constituição da República. “Todos queremos um país mais justo e com menos criminalidade, mas a redução pura e simples da maioridade penal não vai trazer os benefícios esperados pela sociedade”.
Efeitos colaterais
Outro ponto ressaltado por Marcus Vinicius na audiência foram os efeitos colaterais graves que essa mudança na maioridade penal pode gerar, caso venha a ser concretizada. Segundo ele, se passarmos a compreender que não são mais adolescentes as pessoas que possuem entre 16 e 18 anos, essa faixa etária das famílias brasileiras ficará desprotegida de crimes como a exploração sexual de menores, do tráfico internacional de menores e da venda de drogas a menores.
“Esses são tipos penais fixados com relação às pessoas com menos de 18 anos. Se esse patamar for reduzido, as pessoas entre 16 e 18 anos não mais estarão protegidas, o que cria um efeito colateral muito grave e demonstra que esta não é a melhor resposta para o problema da criminalidade”, finalizou.
A audiência pública no plenário 3 da Ala Alexandre Costa foi conduzida pelo presidente da CCJ, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), e contou ainda com a participação da subprocuradora-Geral da República, Raquel Elias Ferreira Dodge. O relator das PECs que tramitam conjuntamente, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) e vários senadores, acompanharam os debates.
As duas próximas audiências que serão realizadas pela CCJ, estas com foco no debate da constitucionalidade das PECs, acontecerão nos dias 10 a 17 de junho deste ano. O objetivo é auxiliar no entendimento dos parlamentares, que deverão votar em breve essa matéria.